Ruralistas querem mudar lei trabalhista para lucrar mais, diz presidente da CUT

Por José Coutinho Júnior, Da Página do MST

A bancada ruralista pretende alterar a legislação trabalhista rural. De acordo com Vagner Freitas, presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), o que os ruralistas querem não é o bem do trabalhador rural, e sim lucrar ao custo do bem estar dos trabalhadores.

“Eles Pretendem flexibilizar a legislação para construir relações de trabalho cada vez mais frágeis no campo, tudo isso para economizar com a mão-de-obra que já é barata. Confira abaixo a entrevista de Vagner Freitas sobre a legislação trabalhista rural e a ofensiva da bancada ruralista:

Como você analisa a legislação rural brasileira?

A legislação trabalhista rural brasileira tem sido aprimorada com o passar dos tempos e representa um instrumento importantíssimo para o assalariado e assalariada rural. Esse aprimoramento, entretanto, não tem acontecido na velocidade que necessitam os assalariados e assalariadas rurais, fazendo permanecer no campo situações como a submissão de trabalhadores a condições análogas às de escravo. 

Vários foram os avanços, como a NR-31, que estabeleceu as regras de saúde e segurança no campo, e a Lei 11.718/2008, que estabeleceu os contratos de curta duração.

No entanto, as aplicações dos contratos de safra no meio rural continuam acontecendo de forma abusiva, sendo utilizados, na grande maioria das vezes, para fraudar contratos de trabalho por prazo indeterminado, retirando do trabalhador rural direitos como seguro desemprego, aviso prévio, multa do FGTS, entre outros.

Há, ainda, a pendência na votação da PEC do Trabalho Escravo, que vem tramitando no Congresso de forma extremamente lenta, colaborando para a existência de trabalhadores em situação de trabalho escravo.

Apesar da legislação, o trabalho rural se encontra precarizado?

Sim. Mesmo com os avanços, não há fiscalização capaz de garantir o cumprimento do que determinam as normas existentes. Da mesma forma, não há um nível de conhecimento dos próprios trabalhadores sobre os seus direitos, já que inexistem campanhas permanentes do Poder Público de conscientização de trabalhadores e trabalhadoras rurais.

Este cenário faz com que a maioria dos trabalhadores, cerca de 65%, estejam na informalidade, e milhares destes submetidos a situações de trabalho degradantes, com jornadas exaustivas e até mesmo trabalho escravo.

Há uma fiscalização forte por parte do governo para verificar se as leis estão sendo cumpridas?

Não. Apesar dos avanços nos últimos anos nas ações de fiscalização, como a criação dos grupos móveis de combate ao trabalho escravo, ainda percebe-se uma ausência considerável do Estado nas frentes de trabalho.

Isso ocorre pela falta de auditores fiscais e estruturas físicas para atender às demandas nas Superintendencias Regionais do Trabalho, além da grande quantidade de frentes de trabalho existentes nos Estados.

Que processos levaram os trabalhadores rurais a conquistar esses direitos?

Foi a atuação do Movimento Sindical ao longo da história, para conquistas destes direitos como pela manutenção dos existentes.

A conquista da NR 31, por exemplo, levou anos de negociação e mobilização dos trabalhadores, assim como as greves no setor sucroalcooleiro, fruticultura, etc., que fizeram com que pudéssemos ter essa legislação, ainda que insuficiente.

A luta dos trabalhadores pela manutenção dessas conquistas é permanente, tendo em vista que ao longo dos anos a bancada ruralista a vem tentando suprimir os direitos destes trabalhadores.

Quais os interesses da bancada ruralista em alterar as leis trabalhistas?

Pretendem flexibilizar a legislação para construir relações de trabalho cada vez mais frágeis no campo, tudo isso para economizar com a mão-de-obra que já é barata. Nas propostas existentes de constituir uma jornada flexivel, por exemplo, o grande objetivo é não realizar o pagamento de horas extras, mesmo submetendo estes trabalhadores a jornadas exaustivas.

No que se refere à saúde e segurança, o objetivo é flexibilizar a NR-31, diminuindo instrumentos de proteção relacionados a transporte, alojamentos e ao próprio processo de fiscalização pelos auditores fiscais.

Como sempre, eles querem diminuir custos e aumentar seus lucros, retirando direitos dos trabalhadores. Nada de novo para um setor que continua admitindo a prática de trabalho escravo em seus empreendimentos, apesar dos inúmeros casos flagrados pelas fiscalizações.

Como você avalia o argumento usado pelos ruralistas de que “deve existir uma lei específica para o trabalhador rural, pois seu trabalho é diferente do homem do campo”?

Na verdade é uma tentativa antiga, existente na própria CLT, que prevê a possibilidade de tratamento diferenciado para campo e cidade.

Como os setores patronais urbanos não conseguem flexibilizar toda a legislação trabalhista, este argumento é uma forma de tentar justificar a flexibilização somente na área rural. É uma forma de desmobilizar a sociedade que pouco conhece da realidade do campo. Não há justificativa pra dar tratamentos diferenciados para os trabalhadores do campo.

Quais seriam as consequências para os trabalhadores se a NR 31 fosse derrubada ou alterada?

Se isso ocorrer, prejudicaria as condições de trabalho no que se refere à saúde e segurança, expondo trabalhadores a riscos seríssimos de vida. Outro prejuízo refere-se ao processo de fiscalização, já que a NR-31 é responsável por garantir condições e segurança jurídica das autuações dos auditores fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).

Na verdade, derrubar a NR 31 ou modificá-la, além de suprimir a proteção do trabalhador, representa prejudicar consideravelmente o processo de fiscalização, ou seja, mais obstáculos para a ação fiscalizatória do Estado.

A alegação dos ruralistas é que essa lei é muito rígida…

A NR-31 foi construída de forma tripartite: Estado, Categoria Profissional e Categoria Patronal, ou seja, eles consideram rígidas uma norma que foi construída por eles mesmos? Foi um longo processo de negociação que possibilitou a criação da NR 31 com a participação de todos os atores envolvidos.

Não há justificativa para que ela seja considerada rígida e muito menos para que ela não seja aplicada. O que há, sim, é o descumprimento por parte do setor patronal daquilo que foi acordado entre as partes na mesa de negociação. Talvez eles imaginassem que os sindicatos não iriam cobrar a sua aplicação e que essa legislação fosse apenas mais uma que ficaria engavetada.

No entanto, mesmo com a precariedade da fiscalização, ela tem sido cobrada e tem-se buscado incluir seus principais pontos nos acordos coletivos, o que dá um maior poder de fiscalização também para os sindicatos, por isso que agora eles tentam uma forma de derrubá-la.

Os ruralistas também querem alterar o conceito de trabalho escravo. Como você analisa o conceito atual, e quais as conseqüências de uma possível alteração?

Eles tentarão conceituar de forma diferente “trabalho escravo”, “jornada exaustiva” e “trabalho degradante”. Ou seja, tentam tornar situações inaceitáveis em aceitáveis, descaracterizando-as do trabalho escravo.

A forma como o conceito que está sendo proposto, certamente, permitirá que trabalhadores sejam submetidos à situações degradantes, sem que haja a punição rígida como existe atualmente quando esta situação é considerada trabalho escravo.

Eles tentarão limitar o conceito, fazendo que situações graves não sejam consideradas trabalho escravo, escapando assim da punição. A conseqüência será a exposição maior dos trabalhadores e uma falsa sensação de que o problema não existe, já que se o conceito for simplificado o número de casos aparentemente cairá.

Ao invés do setor patronal encarar o problema de frente, aceitando que existe maus empregadores no seu meio, que praticam o trabalho escravo e que devem ser punidos e excluídos do setor produtivo, eles buscam criar uma legislação que máscara o problema e com isso diminua a estatística tão vergonhosa para o Brasil e para os empresários rurais.

Enviada por José Carlos para Combate ao Racismo Ambiental.

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