Belo Monte: “Obra em que o governo tem interesse, executada por empresa parceira do governo e fiscalizada por um órgão do governo”

“É uma obra em que o governo tem interesse, executada por uma empresa parceira do governo e fiscalizada por um órgão do governo”, afirma André Vilas Boas, secretário executivo da ONG Instituto Sócio Ambiental – ISA. Segundo ele, “falta pulso do Ibama para exigir que se façam valer as compensações ambientais”

Sarah Fernandes – Rede Brasil Atual

Passados dois anos do início das obras da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, no Pará, nem o governo nem o consórcio Norte Energia, responsável pelo empreendimento, têm a dimensão exata do impacto social da construção. Entre outros atrasos, o consórcio até agora não entregou o cadastro socioeconômico das famílias atingidas.

O estudo – necessário para saber não apenas quantas pessoas serão afetadas, mas também onde e como vivem – foi alvo de cobrança do Ibama em parecer técnico emitido em dezembro do ano passado.

No parecer, o Ibama vê com “preocupação” o atraso. “Nem tanto pelo impacto ao cronograma em si, e mais pela necessidade de se ter conhecimento de forma prévia das famílias afetadas pelo empreendimento”, diz o texto.

O cadastro seria a garantia de que as famílias ribeirinhas dos igarapés de Altamira (PA) vão realocadas próximas à sua antiga residência depois da construção da represa. De acordo com o parecer, faltam informações principalmente relacionadas às ilhas do rio Xingu, em especial sobre os pescadores artesanais da região.

O Ibama autuou a Norte Energia em 29 de janeiro e deu prazo de 60 dias para a empresa regularizar a situação. Caso não cumpra o prazo, estará sujeita “sanções administrativas”, que de acordo com a assessoria de imprensa do órgão podem variar de multas a suspensão de atividades. A empresa informou, também via assessoria de imprensa, que o prazo será cumprido.

Para o secretário executivo da ONG Instituto Sócio Ambiental (ISA), André Vilas Boas, que acompanha as obras de Belo Monte, a falta do cadastro socioeconômico impede um maior controle social do empreendimento. “Seria uma forma de deixar o processo mais transparente, pois saberíamos a totalidade dos atingidos e as ações tomadas”, afirma. “Espanta pensar que a obra já foi iniciada há tanto tempo e ainda se desconhece as famílias que serão afetadas por elas”.

Mais atrasos

Além da demora em finalizar o cadastro, o ISA afirma que apenas 19% das condicionantes socioambientais da obra foram cumpridas.

Tais falhas também aparecem no relatório do Ibama. Dentre os principais problemas destacam-se atrasos nas obras de saneamento básico e de infraestrutura nas cidades de Altamira, Vitória do Xingu e dos sítios Belo Monte e Belo Monte do Pontal; e a demora em reassentar as famílias da Vila de Santo Antonio, um processo considerado “traumático” no relatório, por deixá-las “em meio a casas demolidas”, terrenos “tomados por mato, e trânsito de caminhões e pessoas estranhas à comunidade”. “É preciso que o empreendedor inicie imediatamente a construção da nova vila”, diz o parecer.

Além disso, o relatório aponta que é preciso que o empreendedor ofereça, com urgência, assistência técnica em projetos de fomento à agricultura familiar, pois as obras têm gerado aumento nos preços dos alimentos, principalmente em Altamira. “Há um descompasso entre a velocidade com que a empresa executa a obra e a com que faz as condicionantes ambientais”, afirma Vilas Boas.

De acordo com a empresa, foram investidos R$ 722,7 milhões até fevereiro de 2013 nos 11 municípios da área de influência de Belo Monte, sendo R$ 302 milhões para Altamira. A verba financia escolas, postos de saúde e reforço na segurança pública. “Aproximadamente R$ 106 milhões já foram destinados pela Norte Energia para ações de educação, saúde, segurança, saneamento básico, entre outras”, informa, em nota.

Para Vilas Boas há um conflito de interesses que impede uma fiscalização mais eficiente. “É uma obra em que o governo tem interesse, executada por uma empresa parceira do governo e fiscalizada por um órgão do governo”, afirma. “Falta pulso do Ibama para exigir que se façam valer as compensações ambientais”.

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