A violência contra a mulher e o silêncio da sociedade

Por: Sandra Lia Bazzo Barwinski*

A sociedade identifica a gravidade da violência apenas quando ela é praticada de modo ostensivo ou chocante. Infelizmente, precisamos nos apropriar desses desastrosos momentos para debater o tema. Homens e mulheres enfrentam a violência; diferenciam-se porque homens geralmente se envolvem em conflitos em relação ao trabalho ou ao crime em geral. E as mulheres estão sujeitas à violência doméstica, familiar e sexual. Isso decorre de uma cultura que estabeleceu a desigualdade de tratamento e de poder entre homens e mulheres.

A legislação pátria atinente aos direitos da mulher vem sofrendo profunda modificação. Mas não basta! É necessário que os intérpretes e aplicadores da lei introspectem estes novos conceitos. Em 2009, o Código Penal foi alterado e a sexualidade passou a ser um atributo da pessoa humana e expressão de sua dignidade. O estupro agora é crime contra a dignidade sexual.

Estereótipos, preconceitos e discriminações de gênero estão presentes na nossa cultura e interferem na realização da justiça. Mas o sistema penal não tem a função de promover direitos. O ideal da igualdade entre homens e mulheres requer a adoção de políticas públicas eficazes à transformação social. A sociedade deve ser esclarecida sobre o que é a violência contra a mulher e entendê-la como fato reprovável e juridicamente punível.

Parte considerável das mulheres não denuncia os crimes pelo receio; um injusto sentimento de vergonha as inibe e oprime, deixando que aceitem para si próprias uma culpa da qual não têm nenhuma responsabilidade. Denunciar a violência é fundamental para a responsabilização de seus autores. A ausência da denúncia favorece a perpetuação e a repetição da violência contra a mulher.

É importante frisar que a assistência médica é prioritária, precede e independe de qualquer providência policial ou judicial. A mulher que sofreu violência sexual tem direito à integral assistência médica e à plena garantia da sua saúde sexual e reprodutiva, de forma segura, adequada e acessível.

A mulher que sofre violência sexual não deve fazer higiene pessoal ou trocar suas roupas até receber atendimento de um médico ou policial. Deve procurar imediatamente um serviço de saúde para prevenção das DSTs, aids e gravidez indesejada. Depois de 72 horas do fato, a eficácia da medicação estará comprometida e a mulher, em risco. Se a prevenção da gravidez decorrente de violência sexual falhar ou não for mais possível, a mulher terá direito ao aborto legal.

As leis refletem valores que estão albergados na sociedade. Quando o querer coletivo representa um querer legal, as normas tendem a ser eficazes. Beatriz de Murguía, abordando o papel dos indiferentes (nem judeus, nem nazistas, nem simpatizantes) aos horrores do Holocausto, questiona: qual é a culpa daqueles que não fazem nada para evitar um conflito? Pergunto, então: qual é a culpa daqueles(as) que não fazem nada para evitar a violência contra a mulher? Qual é a culpa daqueles(as) que criam seus filhos para serem machos, viris, fortes, e suas filhas para serem dóceis, submissas e bem comportadas?

A massa silenciosa é essencial para o êxito da violência. Quem prefere não se envolver, porque acredita que ficará à margem do problema, age em favor da violência.

*Sandra Lia Bazzo Barwinski, advogada, é ex-presidente da Comissão da Mulher Advogada da OAB-PR e coordenadora-executiva do Fórum de Mulheres do Paraná. Texto publicado no jornal Gazeta do Povo no dia 27/01/2013.

Enviada por José Carlos para Combate ao Racismo Ambiental.

http://www.ccr.org.br/jogo-rapido-detalhes.asp?cod=147

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