Batalha jurídica deve selar destino de índios da aldeia Maracanã

A disputa jurídica a respeito do destino dos cerca de 60 indígenas que vivem há seis anos no prédio do antigo Museu do Índio, ao lado do estádio do Maracanã (zona norte do Rio), deve se intensificar nesta semana, após momentos de tensão durante o cerco pela polícia ao local no último sábado

Caio Quero – BBC Brasil

De um lado está o governo do Estado do Rio de Janeiro, que pretende demolir o prédio como parte do projeto de modernização do estádio do Maracanã para a Copa de 2014. Do outro estão indígenas e movimentos sociais, que defendem a preservação do imóvel e o direito dos índios de permanecer na área, rebatizada por eles de aldeia Maracanã.

A questão promete seguir para outras instâncias. A Defensoria Pública do Estado obteve uma decisão judicial que obriga o governo a cumprir diversos requisitos no caso do despejo dos índios. Ao mesmo tempo, na esfera federal, defensores públicos da União prometem levar o caso ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).

De acordo com o defensor público federal Daniel Macedo, o órgão pretende questionar no STJ decisão tomada em novembro pela Justiça Federal do Rio, que cassou duas liminares que impediam a demolição do prédio e a retirada dos índios do local. “A defensoria vai tentar ganhar mais tempo agora para recorrer da decisão da presidência do tribunal. A gente vai tentar interpor algum recurso para o Superior Tribunal de Justiça”, disse Macedo à BBC Brasil. Segundo ele, a medida já deve ser tomada nesta semana.

Disputa
Após meses de disputa, a tensão a respeito do destino do terreno se intensificou no último sábado, quando homens do Batalhão de Choque cercaram a entrada do prédio. O líder da comunidade, cacique Carlos Tukano, afirmou que os índios resistiriam de maneira pacífica a uma eventual desocupação.

De acordo com a Defensoria Pública da União, que estava presente no local, no entanto, o governo não possuía um mandado de imissão de posse, necessário para que os policiais entrassem no imóvel, e, após um cerco de quase 12 horas, os homens da tropa de choque deixaram o local sob aplausos dos indígenas e seus apoiadores.

Ainda na noite de sábado, a Defensoria Pública do Estado do Rio obteve uma decisão que impede que a desocupação seja feita sem autorização judicial ou a presença de órgãos de assistência social e da Secretaria de Justiça. Além disso, o governo teria que garantir que os bens dos moradores sejam encaminhados para um depósito público.

“Aquele cenário que aconteceu no sábado não pode se repetir. Era a polícia de choque, sem ordem judicial, em uma postura de intimidação”, disse à BBC Brasil o defensor público estadual Eduardo Newton.

Para o defensor público federal Daniel Macedo, a decisão da Justiça estadual vai dar mais tempo para que outras medidas contra a demolição e desocupação do local sejam tomadas. “Isso vai fazer com que a Defensoria Pública federal ganhe mais tempo, porque o Estado não vai ter tempo de se estruturar com a decisão da Justiça estadual”, disse Macedo. “A ideia é tentar forçar o Estado a desistir (de demolir) o Museu do Índio e tentar preservar.”

Ocupação
Construído em 1862, o edifício onde agora fica a Aldeia Maracanã abrigou o antigo Serviço de Proteção ao Índio – fundado pelo marechal Cândido Rondon em 1910 – e o Museu do Índio. Desde 1978, no entanto, o prédio ficou abandonado e foi ocupado em 2006 pelos membros da aldeia Maracanã.

Em outubro do ano passado, o governo estadual formalizou a compra do terreno, que pertencia à Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), órgão ligado ao Ministério da Agricultura. Atualmente, cerca de 60 índios moram no local, entre eles 40 adultos e 20 crianças. A aldeia abriga índios de diversas etnias, entre elas, pataxós, tukanos, apurinãs e guajajaras. Segundo Carlos Tukano, um dos líderes da comunidade, o clima no local é de apreensão. “Não está tão tranquilo. Ninguém sabe o que vai acontecer”.

Apesar de desejarem permanecer no local, Tukano diz que os índios estão abertos a negociações, mas afirma que, até agora, não foram procurados pelo governo para dialogar. “A gente pode sentar e conversar. Fazemos um trabalho cultural aqui desde 2006, desde que chegamos. Isso eles têm que respeitar e, para isso, nós precisamos desse espaço ou outro espaço digno.”

Cadastro e remoção
Por meio de uma nota, o governo do Estado do Rio de Janeiro afirmou que representantes da Emop (Empresa de Obras Públicas) e da Secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos estiveram no antigo Museu do Índio para cadastrar os moradores do local para realizar a remoção.

“Há um processo de negociação e cadastramento das pessoas que estão no prédio feito através da Secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos”, diz o comunicado.”A demolição do prédio do ex-Museu do Índio integra o projeto de modernização do complexo do Maracanã, sendo parte importante na questão da mobilidade.”

Ainda segundo a nota, “o Estado tem a posse do imóvel para entrar no ex-Museu do Índio”, e a operação do sábado foi para “atualizar os contatos com as pessoas que estão no prédio, de forma que, durante a semana, seja finalizado o cadastro social e haja remoção das pessoas e, logo que possível, a demolição do prédio”.

As obras do Maracanã devem ser finalizadas em abril, com a formalidade de entrega do estádio à Fifa prevista para o dia 28 de maio.

http://www.ihu.unisinos.br/noticias/516954-batalha-juridica-deve-selar-destino-de-indios-da-aldeia-maracana

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