Ampliação de megainvestimento da Celulose Riograndense: o “salva-vidas de chumbo 2.0” para o Estado?

Excelentíssimo  Senhor Tarso Genro, Governador de Estado

Excelentíssimo  Senhor Alexandre Postal, Presidente da Assembleia Legislativa do Estado

Excelentíssimo  Senhor Helio Corbellini, Secretário Estadual do Meio Ambiente

A Assembleia Permanente de Entidades em Defesa do Meio Ambiente do Rio Grande do Sul – APEDEMA/RS vem a Vossa Senhoria manifestar sua posição em relação à ampliação de megainvestimento da Celulose Riograndense em nosso Estado.

Na década de 70, justamente durante o surgimento do movimento ambientalista no Brasil, e em especial com a criação da AGAPAN, houve um dos mais importantes embates contra as empresas poluidoras no Estado do Rio Grande do Sul. Tratava-se do caso da empresa de celulose Borregaard, que começou suas atividades, em 1972, na cidade de Guaíba. O nome da empresa chegou a ser sinônimo de mau cheiro (odor de repolho podre) que afetava a zona sul de Porto Alegre e, não raras vezes, toda a cidade.

Em 1974, a referida empresa teve o cancelamento de seu funcionamento por mais de três meses até que resolvesse todos os aspectos relativos às emissões aéreas e aos efluentes resultantes de sua operação, considerados nocivos à saúde pública e ao meio aquático. Depois da Borregaard, veio a Riocell, logo depois a Aracruz, e agora a Celulose Riograndense, de capital chileno (CMPC). Esta última anuncia agora sua ampliação (de 400 milhões de toneladas para 1,75 milhões de toneladas), alardeando a criação de milhares de empregos, como a Aracruz fez em 2008, antes de quebrar. Mas pouco se fala que 90% da celulose produzida serão para exportação e menos de 10% para sua transformação em papel, aqui no Brasil.

Cabe lembrar que em 2008, a então empresa Aracruz, que anunciava também a ampliação da planta industrial, e que possuía investimentos do BNDES, tinha aplicado em derivativos (especulação financeira), tendo sido afetada pela crise econômica mundial, gerada nos EUA, vindo a perder em poucas semanas algo como 2 bilhões de reais.

Nestas quatro décadas, o crescimento da planta industrial não eliminou, de todo, o cheiro ruim, principalmente no município de Guaíba. Além disso, pairam sérias dúvidas, de parte de técnicos da FEPAM e também de ambientalistas de renome, como o Prof. Flávio Lewgoy, sobre os sérios riscos à saúde humana e meio ambiente, ligados a enorme carga de poluentes (dioxinas, furanos, gases de enxofre, etc.) gerados por este e outros empreendimentos industriais concentrados na região.

Cabe destacar que estamos lidando com um voo no escuro, tanto do ponto de vista ambiental como econômico. Atualmente, a FEPAM tem sua rede de monitoramento da qualidade do ar na Região Metropolitana de Porto Alegre praticamente sucateada, ou seja, sem funcionar. Por outro lado, a SEMA não consegue fiscalizar a implantação de todos os megaplantios de eucalipto que convertem parte importante do que resta de campos nativos do bioma Pampa, por falta crônica de técnicos e de condições adequadas de trabalho. Esta semana, mais uma vez, documentos das associações de funcionários da FEPAM e DEFAP chamam a atenção à sociedade gaúcha sobre a falta de solução também com respeito ao prédio parcialmente interditado da SEMA, há quase 10 meses.

Em relação a estes megaempreendimentos de celulose associados a monoculturas arbóreas – também criticados no Chile, Uruguai e Argentina – há alguns anos, o escritor uruguaio Eduardo Galeano escreveu um artigo marcante, denominado “Salva vidas de Chumbo” (2007) questionando semelhantes megainvestimento de celulose em seu país:

“O que esses esplendores nos deixaram? Nos deixaram sem herança nem bonança. Jardins transformados em desertos, campos abandonados, montanhas esburacadas, águas apodrecidas, longas caravanas de infelizes condenados à morte antecipada, palácios vazios onde perambulam fantasmas…Agora, chegou a vez da soja transgênica e da celulose. E outra vez repete-se a história das glórias fugazes, que ao som de seus clarins nos anunciam longas tristezas. […] A celulose também está na moda, em vários países. Agora, o Uruguai está querendo se transformar num centro mundial de produção de celulose para abastecer de matéria prima barata as longínquas fábricas de papelTrata-se de monocultivos para a exportação, na mais pura tradição colonial: imensas plantações artificiais que dizem ser bosques e se convertem em celulose num processo industrial que arroja detritos químicos nos rios e torna o ar irrespirável.”

O Estado do Rio Grande do Sul não merece ser, mais uma vez, palco de megainvestimentos de alto risco, ligados a um jogo econômico que, de antemão, concentra capital na mão de poucos, espalha monoculturas e ameaça à saúde da população e ao meio ambiente.

A Sociedade Gaúcha clama a responsabilidade de seus governantes para que se abandonem as atividades calcadas em gigantescos empreendimentos, de alto risco, e priorizem sua atenção aqueles setores que mais estão associados à sustentabilidade econômico-ecológica como as tecnologias sociais, associadas prioritariamente em energias limpas, à agroecologia, ao turismo rural e ecológico, entre outros.

Porto Alegre, 12 de dezembro de 2012.

Assembleia Permanente de Entidades em Defesa do Meio Ambiente do RS

Enviada por Zuleica Nycz.

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