O que falta no Novo Marco da Mineração

Eric Andriolo
do Observatório do Pré-sal

A caixa preta que se tornou o Novo Código da Mineração deu o tom do conversatório “Novo marco da mineração”, que reuniu na última segunda (3), no Ibase, representantes da sociedade civil e entidades do setor. A falta de transparência no processo de criação do documento, especialmente por suscitar dúvidas em relação aos interesses do governo federal no tema, foi criticada.

“Que política mineral haverá neste documento? Não se sabe!”, observou Francisco Fernandes, do Centro de Tecnologia Mineral.

No entanto, para o ex-secretário de Geologia e Mineração do Ministério de Minas e Energia, Cláudio Scliar, esta crítica não se aplica, pois o documento está sob sigilo por ainda estar tramitando e, por isso, não pode ser levado à público.

Embora reconheça a necessidade de haver um novo marco legal para o setor, a geóloga e ex-assessora da Secretaria de Geologia e Mineração, Maria Amélia Enríquez, afirma que o documento peca por focar apenas na arrecadação de fundos. “O novo Marco é necessário porque o regulamento vigente está ultrapassado e possui muitas fragilidades que têm levado a mudanças constitucionais. Mas não estabelece a mineração como assunto estratégico e se concentra apenas na arrecadação de fundos. O documento teria que dar atenção à governança pública, à necessidade de agregar valor aos bens minerais e à sustentabilidade no processo de exploração”, alertou.

Apesar de o desenvolvimento sustentável ter sido anunciado como parte da elaboração do Marco, ficou claro, durante a conversa, que a preocupação do governo federal é a de otimizar a arrecadação de recursos com o novo documento, que estabelece um sistema de royalties variando as alíquotas de acordo com o tipo de material extraído. “É uma questão do papel econômico do recurso”, afirmou Scliar.

A preocupação da sociedade civil, pesquisadores e movimento sociais é que, com a ênfase na arrecadação de recursos, o Novo Código deixe de lado os impactos em terras de comunidades tradicionais, camponesas e indígenas que têm subsolo rico e que, por isso, são frequentemente atingidas pelos impactos da indústria extrativista.

Ao se posicionar em defesa do governo federal, Scliar deixou claro que a questão das terras indígenas não está incluída no Marco Regulatório porque o Ministério de Minas e Energia entende que a legislação brasileira já considera ilegal toda exploração de recursos naturais em territórios indígenas.

“Nenhum dos países latino-americanos está implementando sua legislação indígena”, rebateu Carlos Monge, antropólogo peruano e historiador do Revenue Watch Institute, que chamou atenção também para as questões territoriais e os direitos dos trabalhadores.

Embora o debate tenha suscitado polêmica, houve consenso em torno da necessidade de se discutir o tema neste momento. A diretora do Ibase, Moema Miranda, resumiu a importância do diálogo: “É claro que existem questões específicas, questões técnicas, mas acho que isso não justifica, num Brasil democrático, não termos acesso a uma versão da proposta que está sendo discutida”. Moema também classificou o sigilo sobre o Novo Marco como “constrangedor”, e advertiu que a ausência de debate favorece certos grupos de interesse.

“O aparelhamento dos grandes grupos do setor privado é muito maior que o da sociedade civil organizada, então a ausência do debate público, na verdade, favorece os mesmos grupos de interesse que talvez até esse novo marco esteja tentando limitar”, concluiu.

O que falta no novo marco da mineração

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