MG – Vale não desiste de destruir a Serra da Gandarela

A Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH) vive hoje um momento decisivo quanto à segurança do seu abastecimento público de água; o aumento do consumo e o comprometimento, tanto em volume quanto em qualidade, dos seus principais mananciais abastecedores ameaçam não somente o fornecimento atual, mas principalmente o abastecimento futuro.

A mineração, sobretudo a de minério de ferro e a céu aberto, vem destruindo muitos dos principais mananciais da Região Metropolitana de Belo Horizonte, juntamente com a paisagem e belezas naturais do principal circuito turístico de Minas Gerais. Além disso, a exploração mineral já destruiu a maior parte das áreas de cangas ferruginosas que protegem estes mananciais; as últimas áreas contínuas expressivas deste geossistema no Quadrilátero Ferrífero encontram-se na Serra do Gandarela, e sua destruição significaria um passo irreversível para a extinção deste ecossistema raro e precioso na região central de MG.

O governo de Minas Gerais assumiu o propósito de cumprir a Meta 2014, de melhoria das águas do rio das Velhas. As águas do Alto Rio das Velhas, captadas na ETA Bela Fama, entre Nova Lima e Raposos, são responsáveis pelo abastecimento de mais de 60% da água consumida em Belo Horizonte. A margem esquerda do Velhas, entre Itabirito e a região de Belo Horizonte, recebe hoje as piores águas da bacia (rios de Classes 2 e 3), enquanto a margem direita, a montante de Raposos, cujos rios vêm da região do futuro Parque, é praticamente formada por cursos de Classe 1 e Classe Especial, ou seja, os de melhor qualidade, e que assim garantem um volume de água de qualidade que minimiza o efeito das contribuições mais poluídas e serve de referência para a elevação das águas do Velhas pela qual lutamos, muito particularmente a montante da captação de Bela Fama. A implantação de grandes empreendimentos minerários na Serra do Gandarela comprometeria seriamente as nascentes de vários desses rios. Como alcançar a Meta 2014 entregando à mineração as últimas águas do trecho do alto rio das Velhas que ainda são referência de qualidade?

A importância da região da Serra do Gandarela e a criação da unidade de conservação de proteção integral proposta pelo ICMBio ultrapassam o âmbito local, ou mesmo regional, e se inserem como uma questão nacional que respalda as políticas de conservação e os tratados internacionais firmados pelo país. Essa é uma oportunidade única de dispormos de um Parque Nacional na região natural mais rica da Região Metropolitana de Belo Horizonte, beneficiando a todos – as cidades e as comunidades do seu entorno – com serviços ambientais de importância e valor incalculáveis por um período de tempo indeterminado, muito além dos poucos anos de exploração minerária – atividade econômica de maior poder predatório.

Apesar de todas as manifestações da sociedade civil pela preservação da Serra do Gandarela e do reconhecimento da sua importância por diversas organizações sociais, cidadãos, entes federativos e também pela Justiça Estadual e Federal, a Vale S.A. não desiste de suas pretensões de minerar e destruir a região. A empresa tem feito nos últimos quatro meses sucessivas investidas junto ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), ao Ministério do Meio Ambiente (MMA), ao Ibama e à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais (Semad), para alterar mais ainda os limites propostos para o Parque Nacional da Serra do Gandarela, diminuindo sua área de proteção e comprometendo significativamente a preservação de seu patrimônio socioambiental e hídrico.

O presidente da Vale S.A., Sr. Murilo Ferreira, foi muito claro quanto ao interesse da empresa , em fala na Assembléia Legislativa de Minas Gerais no último dia 20 de agosto, ao afirmar que “o [projeto] Apolo, […] muito importante para o aumento de produção de minério de ferro de alta qualidade, ainda não foi executado – mas nós estaremos perseverando em busca do licenciamento ambiental…” (vejam em http://www.sendspace.com/file/sqma92).

Não temos conhecimento, até o momento, do que está sendo colocado na mesa de negociações pela Vale nessa busca pelo licenciamento ambiental da Mina Apolo, assim como pela possibilidade de outros interesses na Serra do Gandarela, mas temos certeza de que a empresa usa sistematicamente inverdades e mitos, tais como os de que interfere ou compromete muito pouco a qualidade e quantidade dos recursos hídricos, que respeita as leis e que – acredite quem quiser – protege as cangas ferruginosas.

A projetada mina Apolo trará, caso licenciada, além do impacto direto sobre o aquífero de mais de um bilhão de metros cúbicos de preciosa água, destruições irreversíveis à paisagem, com a perda definitiva de cachoeiras belíssimas, de dezenas de cavidades raras, inclusive algumas de relevância máxima, e dos remanescentes mais significativos das singulares cangas ferruginosas, em processo de extinção, no Quadrilátero Ferrífero e Aquífero de Minas Gerais. A biodiversidade endêmica, associada às cangas e aos trechos mais expressivos do bioma Mata Atlântica do entorno de BH, completam o quadro que confere importância nacional e internacional a esta área que a Vale insiste em destruir. Os mapas abaixo mostram parte do que existe de relevância ambiental e cultural na área pretendida para esse empreendimento da Vale S.A.

A própria Vale, no Estudo de Impacto Ambiental da Mina Apolo, reconhece que o empreendimento que insiste em realizar na Serra do Gandarela “…suscita posicionamentos, como a interferência com o potencial turístico regional, com a produção de água para a Região Metropolitana de Belo Horizonte, com a conservação da biodiversidade…”(EIA Apolo, pg. 17).

Mas a Vale quer ainda mais: quer explorar outras áreas do Gandarela, como a região do Baú e a serra da Capanema, afetando quase todos fragmentos remanescentes do geossistema de cangas ferruginosas e totalizando uma área de mais de cinco mil hectares de intervenções. Vejam no mapa a seguir o que a Vale S/A quer.

Por tudo isso, no grupo de trabalho criado pelo governo de Minas no início deste ano, não aceitamos o recorte de exclusão efetuado na proposta original do Parque Nacional da Serra do Gandarela para atender à implantação da cava, pilhas de estéril e algumas estruturas da Mina Apolo. Apesar de não contar com nenhuma justificativa técnica e plausível para tal, este inaceitável recorte se manteve a partir de um acordo político entre o presidente anterior do ICMBio e o Governo do Estado de Minas Gerais. Manifestamos nossa posição contrária a isso durante as consultas públicas e através de correspondência enviada no prazo estipulado após a sua realização. Contamos que a mesma, embasada técnica e juridicamente, seja considerada na tomada de decisão pelo ICMBio/Ministério do Meio Ambiente.

O projeto do Parque Nacional da Serra do Gandarela e projetos de mineração na mesma região são excludentes e dificilmente conciliáveis, levando-se em conta a somatória de impactos e níveis de degradação socioambiental associados aos últimos. Consideramos que a importância ambiental do Gandarela não deve estar sujeita a interesses que não levem em conta os direitos coletivos, principalmente o direito à água e a um meio ambiente equilibrado – como determina a Constituição da República Federativa do Brasil.

Afirmamos, mais uma vez, que a criação do Parque Nacional da Serra do Gandarela é a oportunidade histórica de Minas Gerais começar a mudar um placar que, até hoje, infelizmente, tem tido como vencedor um só lado, o da mineração e destruição ambiental, para benefício de poucos e ônus para muitos. A preservação integral desta região deveria ser tratada como parte da compensação ambiental devida pelas mineradoras à sociedade por todos os outros empreendimentos que vêm destruindo tantas outras serras e mananciais de Minas Gerais e muito particularmente na APA Sul da RMBH. Nessa ótica, o que está em jogo não é a possibilidade de criarmos uma reserva ambiental em região de mineração, mas a necessidade imperiosa de não se minerar uma área importantíssima em termos ambientais – e apontada como de prioridade máxima de conservação em relatórios de âmbito federal e estadual.

Por isso, denunciamos a Vale S.A. por insistir em destruir uma área estratégica para o futuro e a segurança hídrica e ambiental da região metropolitana de Belo Horizonte. Denunciamos também que a Vale já trabalha hoje na área onde planeja a Mina Apolo, como se tivesse certeza do empreendimento, fazendo sondagens para uma barragem de rejeitos num dos rios mais limpos e de valor turístico da região, desmates para passar uma linha de transmissão, compra de terrenos e conflitos com proprietários que não querem vender suas terras.

Conclamamos os acionistas majoritários da Vale S.A. – funcionários do Banco do Brasil e demais associados à Previ e acionistas de Fundos Bradesco e Santander, entre outros – a avaliar se é esta a empresa que querem para assegurar previdenciária e pecuniariamente seu futuro, à custa de tantos sacrifícios ambientais e da perda de valores fundamentais para a vida de todos nós, como água e biodiversidade.

Se há um valor a compartilhar neste momento, este é a nossa dignidade e a criação do Parque Nacional da Serra do Gandarela, com suas formações serranas e cursos d’água preservados da atividade predatória da mineração.

Assim, conclamamos a todos aqueles que pensam como nós a se manifestarem contrários à insensatez que seria a destruição deste patrimônio de valor incalculável.

Participe do Dia do Parque Nacional da Serra do Gandarela no próximo dia 30.

Cadastre-se no site www.aguasdogandarela.org, receba nossas informações e atualize-se da programação de atividades na região do Gandarela.

Enviada por pe. Dário.

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