Movimentos que lutam por moradia realizaram diversas ocupações nesta madrugada (03) em terrenos e prédios abandonados da União; um dos locais pertence ao Banco do Brasil, o outro, ao INSS
José Francisco Neto, de São Paulo
Por volta das 23h50 deste domingo (02), quatro homens com alicates em mãos e mais dois pés de cabra estouraram, em questão de segundos, os cadeados do prédio localizado na rua Doutor Pennaforte Mendes, 80, Bela Vista, centro de São Paulo. Em seguida, cerca de 80 pessoas, entre homens, mulheres e crianças desceram do ônibus e adentraram rapidamente no imóvel – uma antiga fundação do Banco do Brasil – pertencente ao governo federal, abandonado há mais de dez anos. As outras famílias, num total de 200, foram chegando na sequência.
“Vamos tomar cuidado, gente”, alertavam os homens que direcionavam as famílias que, aos poucos, iam se avolumando no prédio de cinco andares. No segundo piso, as bandeiras do movimento por moradia foram colocadas de frente para a rua, uma maneira de se comunicar com quem está do lado de fora.
Crianças, jovens, adultos e idosos compõem o grupo dos sem-teto do Movimento de Moradia da Cidade de São Paulo (MMC). Aos poucos eles foram se organizando da maneira que dava. Cobertores esticados pelo chão e outros com jornais se ajeitavam em meio à poeira que levantava.
Dilce de Souza Cajaíba e Eva Maria, ambas de 54 anos, conversavam enquanto se arrumavam para descansar. “Amanhã, quando eu sair daqui, vou direto pro trabalho”, disse Dilce, que trabalha de doméstica desde quando chegou em SP. Ela argumenta que o aluguel que paga é um dinheiro sem retorno, por isso está no movimento pra conquistar sua moradia.
“Aqui meu objetivo é pagar por algo que seja meu no futuro. O dinheiro do aluguel vai e nunca volta. Aqui é uma garantia que a gente está pagando, mas sabendo que vai ser nosso”, comenta.
Já Eva conquistou sua moradia há quatro anos, mas sempre está junto com o movimento dando apoio para as famílias que ainda lutam. “Não sou só eu que quero morar bem, quero que as pessoas também morem bem”, afirma.
O objetivo da ocupação, segundo Luiz Gonzaga da Silva, o Gegê, coordenador do MMC e membro da Central de Movimentos Populares (CMP), é negociar com o poder público para exigir moradia digna para as famílias que pagam aluguel e vivem em condições desumanas. “Cada ocupação é um novo momento, não dá pra arriscar se teremos acordo ou não”, comenta.
Ocupações simultâneas
Outras ocupações ocorreram na madrugada desta segunda-feira em São Paulo. Diversos movimentos que lutam por moradia realizaram ocupações em terrenos e prédios da União, como forma de agilizar os processos que destinam os imóveis para a construção de habitação popular.
Um dos prédios ocupados é o do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), na avenida 9 de julho, também no centro, abandonado há mais de 20 anos. Cerca de 400 pessoas estão neste momento no imóvel, cujo objetivo é agilizar para que se cumpra a proposta do governo federal em transformá-lo em mais de 300 moradias populares.
De acordo com Gegê, essas ocupações acontecem de forma simultânea na cidade de São Paulo, inclusive na Baixada Santista e no interior paulista. “Hoje acontecem de 8 a 11 ocupações. Lutamos para que nas negociações todos possam ser beneficiados”, salienta Gegê.
Longe do aluguel
A maioria das pessoas que ocuparam o antigo prédio do Banco do Brasil neste domingo está em busca de moradia digna, pois não suportam mais pagar aluguel para morar em situação precária. “Eu moro de aluguel na zona sul de SP. Quero sair dessa situação. O objetivo é trazer minha família junto comigo. Se for pra sair da situação que estou, com certeza eu venho com eles pra cá”, disse Edison da Silva Santos.
Antônio Alves de Souza, de 64 anos, mora com a esposa em Itaquera, zona leste de São Paulo, e o seu caso se assemelha com o de Edilson. “Eu pago R$ 600 de aluguel. Trabalho durante o dia e estudo a noite com minha companheira. Trabalho de encanador. Ganho R$ 900 por mês, só que lá o cara, além do aluguel, também cobra imposto. Se for somar pago quase R$ 800 mensais”, comenta senhor Antônio.
Por volta das 3 horas da madrugada, as poucas pessoas que permaneciam acordadas, foram se acomodando para descansar, pois amanhã “seria um novo dia de luta”. “A nossa ideia é permanecer dentro do prédio, para não esvaziar e não corrermos o risco de não entramos mais”, reforça Gegê.
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Enviada por José Carlos para Combate ao Racismo Ambiental.