Dia sem festa em tribo indígena no Vale do Rio Doce

Pataxós reclamam de assistência precária em aldeia no Vale do Rio Doce

Na aldeia Guarani, em Carmésia, os pataxós reclamam que não podem caçar e pescar e que foram esquecidos pelos órgãos públicos

Ana Lucia Gonçalves e Marcelo Ramos

O “Dia do Índio” – lembrado nesta quinta-feira (19) em todo o país – vai passar em branco para os 324 pataxós da aldeia Guarani, em Carmésia, no Vale do Rio Doce. Alegando não ter o que comemorar, os indígenas – que na última segunda-feira despejaram, na porta da prefeitura, o lixo que há mais de 20 dias não era recolhido pelo serviço de limpeza do município – propõem ao “homem branco” um dia de reflexão, e não de festa.

“Não temos mais como caçar, pescar ou produzir alimentos. Ainda por cima, fomos esquecidos pelos órgãos que deveriam nos proteger, atender às nossas necessidades básicas. O alento é ver as crianças brincando, com saúde”, desabafa a cacique Apinaera Pataxó, de 46 anos.

Com nove filhos, 18 netos e um bisneto, a líder da aldeia Retirinho –o território Guarani tem 3.200 hectares e é dividido em três grupos– faz coro com outro guerreiro, o cacique Romildo Pataxó, da aldeia Imbiruçu. Para ele, 19 de abril deveria ser um dia “de luto”, por causa da morte de antepassados na luta pela terra e em defesa da cultura do povo.

“Nossos velhos foram exterminados e chegamos aqui, há quatro décadas, refugiados da Bahia. Esse é um momento de reflexão. A luta pela sobrevivência é muito grande”, diz Romildo, reclamando que na aldeia faltam estrada, pontes e saneamento básico, além de assistência médica, odontológica e ambulatorial adequadas.

Na noite desta quarta, o grupo preparava o Centro Cultural para a Awê Kêpoy Mongangá, uma “dança com os espíritos”. Depois, beberia “cauim”, bebida à base de mandioca, e dormiria em barracas de lona montadas debaixo da cabana. O objetivo era manter os índios unidos para os debates sobre a situação em que vivem. Nos dias 28 e 29, os pataxós voltarão a se reunir para festividades religiosas chamadas de “Awê Reruê”, que significa “união espiritual” e, no dia 3 de outubro, farão a “Festa das Águas”. “O Dia do Índio não é importante para nós”, reitera Romildo Pataxó.

Tribo reclama que não tem mais como caçar, pescar ou produzir alimentos (Foto: Leonardo Morais)
Censo aponta mais índios
A publicação do Censo Demográfico Indígena 2010, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostra que houve aumento do número de pessoas que se declararam indígenas no país.De acordo com o levantamento, 34,5% dos municípios brasileiros tinham pelo menos um indígena autodeclarado, em 1991. Hoje, esse percentual subiu para 80,5%.Demógrafos apontam que a evolução se deu pela conscientização dessas pessoas que, no passado, temiam ser relacionadas com os índios. “Hoje, os indígenas têm mais informações sobre seus direitos, além de mais mobilidade e acesso à educação, o que pode justificar essa expansão de índios pelo país”, observa a demógrafa Luciene Longo, do IBGE.

Observação que é compartilhada pelo professor da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e especialista em povos indígenas, Paulo Maia. “Hoje, há muitos indígenas que vão para as cidades para fazer curso superior. Mesmo assim, a situação do índio ainda é muito precária, pois falta uma política que trate das necessidades de cada etnia. Há tribos no Alto Amazonas que vivem de maneira saudável, enquanto indígenas do Mato Grosso do Sul estão sendo exterminados por fazendeiros. Os maxacalis, em Minas, vivem espremidos entre grandes fazendas. Não é possível afirmar que todo índio é igual”, diz o professor.

http://www.hojeemdia.com.br/minas/dia-sem-festa-em-tribo-indigena-no-vale-do-rio-doce-1.434611

Enviada por José Carlos.

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