Tião Santos: Presidente da Associação de Gramacho também é premiado

Mariana Filgueiras

Quando recebeu a notícia de que tinha sido um dos ganhadores do Prêmio Faz Diferença, o catador de material reciclável Sebastião Carlos dos Santos estava no meio de um engarrafamento, vindo de Cabo Frio, na Região dos Lagos, onde foi passar o réveillon com a família. Foram os únicos dias de folga que tirou ao fim de um ano intenso, mas repleto de conquistas.

Em meio ao buzinaço dos carros na estrada, Tião Santos fez uma retrospectiva de sua vida: desde quando começou a trabalhar no Aterro de Gramacho para ajudar nas despesas da família, passando pela luta diária para melhorar a qualidade de vida dos catadores, até o sucesso do filme “Lixo extraordinário”, do qual participou como protagonista, indicado ao Oscar de melhor documentário no ano passado.

– Num ano que começou com aquela montanha de lixo na Praia de Copacabana, ganhar esse prêmio é um sopro de esperança: significa que ainda há pessoas que se importam com a causa do lixo, apesar do que se vê nas ruas – diz Tião, que chegou a fotografar o mesmo problema na Praia do Forte, em Cabo Frio, onde estava. Presidente da Associação dos Catadores do Aterro Metropolitano de Jardim Gramacho (ACAMJG), uma das quatro cooperativas do aterro, com 1.300 filiados, Tião é o articulador responsável por transformar aquela imensa área insalubre num polo de reciclagem que atende milhares de trabalhadores.

Tião ficou conhecido depois de protagonizar o filme “Lixo extraordinário”, que conta a história do trabalho artístico e social realizado pelo artista plástico Vik Muniz com os catadores de lixo do aterro. Depois que a fita foi ao Oscar, teve muito mais visibilidade para seus projetos no local. Sem saneamento básico ou qualquer infraestrutura para os moradores que lá trabalham, o aterro deverá ser desativado ainda este ano.

– Nossa meta agora é aumentar o número de galpões de reciclagem de um para quatro. Assim, quando o aterro fechar, todos os catadores terão mais estrutura de trabalho. Vamos lutar por projetos de qualificação profissional e por uma revitalização completa do bairro. Não adianta fechar o lixão sem dar uma condição de vida digna a esses trabalhadores – ressalta Tião, já em busca de patrocínio para essa nova etapa.

Sétimo filho de um total de oito, Tião nasceu numa família pobre, mas não miserável. O pai era estivador em Recife, Pernambuco, quando decidiu tentar a vida no Rio.

Trouxe a família para Duque de Caxias. Em alguns anos, tornou-se alcoólatra, o que obrigou a mulher a ganhar a vida como catadora em Gramacho junto com seus irmãos mais velhos.

Quando cursava o segundo ano do ensino médio, Tião foi trabalhar na esteira do aterro sanitário. Um dia, encontrou no lixo o livro “O príncipe”, de Maquiavel, que mudou seu ponto de vista do mundo e o despertou para a sociologia. Como tinha boa articulação entre os trabalhadores, logo se tornou um líder entre eles. Depois do anúncio do fim do aterro, no início da década, Tião procurou se informar sobre os direitos dos catadores e passou a participar de encontros nacionais da categoria. Em 2004, fundou com colegas de profissão a associação que hoje preside. Com a ajuda de convênios públicos e parcerias privadas, pouco a pouco eles vão mudando as condições de trabalho do local.

– Esse prêmio é de todos os trabalhadores de Gramacho. Nós todos fazemos diferença. O lixo é um problema de todos; cada um é responsável pelo que consome. Mas é preciso pressionar o poder público a fazer sua parte. E é isso que estamos fazendo – conclui Tião.

http://oglobo.globo.com/projetos/fazdiferenca/revista.asp

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