“O golpe militar de 1964 marcou minha vida e da minha família para sempre. Três palavras me guiaram para enfrentar a vida: lembrar e resistir sempre”. O comentário é de Maria Amélia Teles da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos, que se dedica à responsabilização dos agentes do Estado pelos crimes cometidos durante a ditadura, em artigo publicado por Carta Capital. Eis o artigo
IHU On-Line – Aquele dia 31 de março de 1964, era uma terça-feira. Voltei para casa, depois de um dia de trabalho na Companhia Siderúrgica Mannesmann, no Barreiro de Baixo, periferia de Belo Horizonte. O clima político andava nervoso, conflitos constantes. Havia comentários de todo o tipo na rua; “provocações” de pessoas estranhas, assim como gente que torcia para as reformas políticas prometidas darem certo.
Cheguei cansada e pensava nos acontecimentos violentos ocorridos depois de 13 de março, data memorável do Comício da Central do Brasil, no Rio de Janeiro, quando Jango anunciou as reformas de base, inclusive a tão “temida” pela elite brasileira: a reforma agrária. Alguns dias depois (dia 19 de março), em resposta ao sucesso do comício, as elites organizaram a “Marcha com Deus pela Família e pela Liberdade”, com a mobilização de mulheres das periferias, negras, pobres, dirigidas por uma elite branca da classe média: as “patroas”, integrantes da Igreja Católica, e da cúpula de militares.
Tiveram um amplo apoio das forças conservadoras e reuniram, em Belo Horizonte, cerca de 250 mil mulheres. A marcha ocupava uma extensão que unia as praças Sete de Setembro e Raul Soares (seria um quilômetro de mulheres?). Nesse dia, não me lembro por qual razão me encontrava no centro de Belo Horizonte e vi com meus próprios olhos a Marcha, o que me causou muito mal-estar: ver mulheres pobres sendo manipuladas para defender ideias e bandeiras contrárias a elas próprias e as suas comunidades. Que tristeza que eu senti. Pensei com os meus botões: “há algo errado no nosso trabalho”. (mais…)
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