José Ribamar Bessa Freire
A universitária Valéria Silva, do Curso de Museologia, não esperou a aula terminar. Ali mesmo, na sala, diante de seus colegas, tirou um revólver da mochila e disparou um tiro certeiro nos cornos do professor de antropologia que caiu estrebuchando numa poça de sangue e saliva, sem largar o giz que segurava entre os dedos. “Ele falava demais” – ela disse ao reitor, a quem entregou a arma, ainda trêmula, as bochechas infladas, os olhos injetados, quase saltando das órbitas.
BALA CALA DOCENTE, berraram os jornais no dia seguinte, registrando depoimentos dos colegas de Valéria, que nunca escondeu seu ímpeto assassino, nem mesmo para os vizinhos do edifício em Botafogo onde mora: – “Um dia eu ainda mato esse ladrão de discurso, que sufoca a gente. Ele fala, fala, fala e não ouve ninguém. Não deixa aluno abrir a boca. Rouba a nossa voz, nos impõe um silêncio humilhante”. Colegas e vizinhos julgavam que era apenas uma forma exagerada de expressar seu descontentamento.
E era, porque nesse relato, onde quase tudo é verdade – personagens, ‘ameaças’ de morte e até o domicílio em Botafogo – o desenlace fatal não aconteceu (ainda?) porque Valéria, por enquanto, não mata nem mosquito da dengue. O crime só foi aqui encenadopara mostrar como a mídia está se lixando para os eventos acadêmicos. Uma aula, por mais excepcional que seja, jamais será notícia, a não ser que uma aluna fique nua dentro da sala ou use mini-saia como aquela estudante que causou o maior tumulto em uma faculdade de São Bernardo do Campo (SP). Mas aí, a notícia não é a aula.